Gente amiga, resolvi postar um artigo bem interessante sobre como abrir uma editora, no blog Carreira Solo. Aqui vai:
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Quero montar uma editora. Como fazer?
por Carolina Vigna-Marú
Algumas linhas gerais. Mas é extremamente importante que você siga a sua intuição e não leve isso aqui a ferro e fogo, ok?
Nota rápida do Editor: a Carol responde seus
e-mails com posts. É um hábito que, para o leitor que mandou o email é
uma surpresa e tanto e para o editor aqui um presente sempre bem-vindo:
um post prontinho! Então aí vai mais uma resposta fundamental para uma
dúvida bastante especial da comunidade dos freelancers brasileiros.
Capítulo de hoje: montar a própria editora!
photo credit: Shraddha Rathi
O mercado editorial está em transformação e, muito sinceramente,
ninguém sabe direito para onde vai. Não tem fórmula mágica, acredite.
Vou tentar te passar aqui algumas linhas gerais mas é extremamente
importante que você siga a sua intuição e não leve isso aqui a ferro e
fogo, ok?
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0. Linha editorial
Botei “zero” de propósito, por ser o ponto mais crucial de uma
editora. Tenha uma linha editorial definida e seja fiel a ela. De nada
adianta você receber, por exemplo, o novo original do
Harry Potter se
você não publica livros infanto-juvenis. Você não vai conseguir
trabalhar o livro direito, até pela falta dos canais certos e vai acabar
matando o original. Com o crescimento natural da editora, nada te
impede de, depois, abrir novas linhas, ou até mesmo novos selos
editoriais, mas mantenha-se sempre fiel às suas escolhas, por mais
tentador que seja algo diferente. É melhor recusar um livro ótimo do que
matar um livro ótimo.
1. Tiragens pequenas
É muito comum que a gente, por entusiasmo, dimensione as vendas de um
determinado projeto com um otimismo além da conta. É fácil cair nessa
armadilha porque os projetos editoriais são feitos com tanto carinho que
é muito difícil acreditar que o resultado final não vá revolucionar o
mundo e vender feito água no deserto. O mercado editorial é um mercado
de paciência. Você pode mudar o mundo sim, mas não vai ser com uma única
publicação. É tudo muito devagar e tudo muito aos poucos. Então, pelo
menos no começo, limite suas tiragens a mil exemplares (o mínimo de
gráficas). Não tem nada de errado – muito pelo contrário – em rodar uma
segunda edição se precisar depois. Tem uma piada velha no meio:
“Como o editor se suicida? Pula do alto do seu estoque.” Então lembre-se: pense muito, crie muito, imprima pouco.
2. Use tudo que puder
Eu estou absolutamente convencida de que a solução para o mercado editorial vai vir dos novos. Use
twitter, plurk, orkut,
qualquer coisa. Desenvolva aplicativos (joguinho, coisas pro facebook,
etc), crie sites colaborativos (e gerencie-os bem!), coloque vídeos no
youtube.
Enfim, use as ferramentas que as editoras grandes não estão usando
ainda (juro que não sei se por ignorância ou arrogância). Não ignore os
pequenos. Tente conseguir que autores e/ou ilustradores seus visitem
escolas ou universidades, dando palestras sobre o trabalho deles e monte
uma banquinha na porta. Mesmo que a venda nestes lugares seja
efetivamente pequena, vá onde está o seu público leitor, dê atenção a
ele, valorize a sua opinião, escute o que tem a dizer. Se você conseguir
ganhar o respeito do seu leitor, você está feito na vida. E para isso
você precisa ir onde ele está. Converse com o seu autor sobre destinar
alguns exemplares gratuitamente, dependendo do caso é claro, a
professores, blogueiros ou outros “disseminadores”.
3. Cuidado com listas de discussão
Especialmente na linha editorial que você pretende seguir, que aqui
no Brasil ainda é bem restrita (e portanto uma oportunidade interessante
editorial, boa escolha!), as listas de discussão tendem a ser
panelinhas fechadas e qualquer iniciativa de divulgar o trabalho nelas
será entendido como spam. Entre, participe, debata outros temas e,
claro, quando couber na conversa, divulgue o seu trabalho. As listas são
essenciais mas precisam sempre ser entendidas como um centro de debate,
nunca como um grande mailing.
4. Seleção de originais
Quando você abrir para chamada de publicação, precisa deixar claro os
seus termos. Deixe claro que é submeter original para análise e que
você não responde por telefone, etc. O processo de ler e analisar um
original é e deve ser lento para ser bem feito, mas é como em uma festa:
quem está na festa se divertindo não sente o tempo passar mas, para
quem está na porta esperando, cada minuto é uma tortura. Ou seja, não
importa o quão rápido você seja nesta análise, o autor sempre estará
ansioso do outro lado. É natural e você precisa respeitar o seu autor,
mas não permita que ele o leve à loucura tampouco.
5. Gráfica
Gráfica boa, felizmente, é o que não falta no Brasil. Esta é a parte
mais simples. Contrate um produtor gráfico e peça orçamento (*) em duas
ou três gráficas diferentes. O produtor gráfico é o sujeito que vai ver o
seu original e vai analisar que gráfica é melhor para o job, que papel é
mais adequado, etc. Nem sempre a melhor gráfica é a mais indicada para
aquele job. Existem autores e ilustradores geniais (
Will Eisner
, só para
citar logo o rei) que criam suas obras em preto e branco. Dependendo da
quantidade de preto, pode ser necessário um papel mais grosso, para não
“vazar” do outro lado, mas por outro lado existem gráficas menores que
fazem bons trabalhos em preto e branco, por exemplo. E você pode rodar o
miolo em um lugar, a capa em outro e juntar tudo em um terceiro, coisa
que pouca gente sabe.
Enfim, é uma área com muitos detalhes e, a menos que você tenha gosto
pela coisa, contrate um produtor gráfico. A boa notícia é que existem
muitos e bons. O custo do profissional se paga com a economia que você
faz em adequar o seu job certinho.
(*) Não estranhe se depois de um certo tempo, a gráfica X sempre
vier com o melhor preço. As gráficas dão descontos para clientes fiéis e
como o seu produtor gráfico sabe disso, vai tentar rodar o seu job
sempre nos mesmos lugares (além do fato dele já conhecer a gráfica, com
quem falar, onde ir, essas coisas). Depois de umas quatro ou cinco
“concorrências” é natural que você escolha algumas gráficas de sua
preferência e fique com elas.
6. Distribuição
A distribuição é o calcanhar de Aquiles de todo editor. É o ponto
mais dfícil. E é enlouquecedor. A maneira mais simples de não ter
vontade e matar um ser humano todo dia no café da manhã é contratar um
distribuidor.
O problema é que eles não aceitam poucos títulos no primeiro contrato
e cobram uma fortuna. Muita gente, por falta de opção, acaba erguendo
as mangas e fazendo a distribuição in house. É nesse momento que você
enlouquece.
Cada livraria fecha de um jeito, em uma data, em determinadas
condições. Os livros e revistas são sempre deixados em consignação nos
pontos de venda e, na data de fechamento, você vai lá e recebe o que foi
vendido. Nesta hora tanto você quanto o ponto de venda podem decidir
renovar o estoque, manter como está ou não continuar mais (e neste caso
você retira, é sempre o editor que paga a retirada, o restante do
estoque).
O percentual de venda, que as livrarias chamam de “o meu desconto”,
gira em torno de 50% do preço de capa. Se você for muito bom negociador,
pode conseguir 40%. Se você for muito bom negociador e tiver muitos
títulos, pode conseguir até 35, 30%, nunca menos que isso. Quem está
começando paga 50% normalmente.
Os seus maiores custos são distribuição e papel. Sobre a
distribuição, temos muito pouco a fazer. Sobre o papel, entra a figura
do produtor gráfica que falei lá em cima. Ele vai saber como economizar
no papel. E isso significa até mesmo mudar o tamanho da publicação para
ter um aproveitamento melhor no corte da folha de papel. Portanto,
contrate o produtor gráfico antes de começar a produção do livro.
7. Autores e ilustradores
Este é um contato pessoal e que a gente desenvolve com o passar dos
anos. Respeite sempre o seu autor e o seu ilustrador mas se faça
respeitar também. Proponha contratos corretos para ambos os lados (sim,
isso é possível). Lembre sempre de colocar uma cláusula no contrato que
te permita usar uma parte do trabalho para divulgação.
Se for de ilustração, deixe claro que você não vai usar a imagem para
outro trabalho mas que precisa usá-la para divulgar o livro. Se for o
de autor, deixe claro que você não vai republicar o texto dele sem a sua
autorização mas que precisa de trechos para divulgação.
Outra coisa muito importante é cultivar o seu autor. Seja
transparente. Mostre a contabilidade a ele (apesar de que eu acho que
isso pode ser entendido como uma forma de tortura). Tenha uma
contabilidade certinha, aliás. Atenda-o quando possível, tirando suas
dúvidas ou simplesmente batendo um papo.
A atividade autoral é uma atividade muito solitária, o autor escreve
absolutamente sozinho e sem certeza alguma de retorno e/ou publicação. O
editor precisa se colocar como um parceiro do autor e nunca como um
negociante. Acredite, tanto você quanto o autor só tem a lucrar com
isso.
8. Organização
Você precisa ser muito, muito, muito (eu já disse muito?) organizado.
Crie arquivos fup (follow up) para cada pessoa com quem você falar,
escrevendo data, horário e conteúdo de telefonema ou email (ou pombo
correio, ou sinal de fumaça, ah você entendeu!). Crie cronogramas
realistas. Tenha cronogramas, aliás. Planilhas são suas amigas.
Organize a sua agenda por segmento (fornecedores, autores,
ilustradores, etc), vai chegar uma hora em que você não vai lembrar se o
Fulano da Silva é designer ou ilustrador, por exemplo.
No começo pode parecer que o tempo que você vai gastar para criar
estas ferramentas de organização é precioso demais para ser gasto com
isso, mas isso vai ser tão útil para você em um futuro breve que vale a
pena, juro.
9. Revisores
Português é um idioma que só não é mais difícil que aramaico arcaico.
Passe seus textos por revisão, de preferência mais que uma. O meu
método pessoal de trabalho é assim (ênfase em pessoal, ok?):
- Rev1 – sempre do editor
- Rev2 – um redator, que muitas vezes pode sugerir alguma melhoria em estrutura
- Rev3 – revisor, para resolver todos os buracos que deixamos na língua pátria.
E, claro, no final volta ao autor. Com o tempo você vai perceber que
existem autores que aceitam este trabalho bem e até te agradecem
eventualmente e existem aqueles que não aceitam mudança alguma.
É óbvio que você precisa ouvir o autor e muitas vezes existe uma
intenção por trás de um erro ou de uma determinada estrutura
lingüística, mas você precisa ter muito cuidado (e fugir destes!) com
autores intransigentes. O respeito precisa ser bilateral.
Lembre sempre que um original que não se adéqua à sua linha editorial
não significa, em absoluto, que o autor não se adéqüe à sua linha
editorial e é importante tratá-lo com respeito, respondê-lo quando
possível, etc, até porque amanhã ele pode te apresentar um texto
fantástico que você vai querer publicar.
Esta relação é sempre muito delicada porque trata-se da criação do
autor, mas valorize os autores que entendem que publicação é um processo
e que cada etapa é importante para o produto final.
De nada adianta um original bem trabalhado e um serviço porco em
gráfica, por exemplo, ou ainda uma ilustração magnífica impressa em um
papel tão vagabundo que se vê a frente e o verso juntos. Editar algo,
não importa o quê (livro, revista, vídeo, cinema, áudio, etc) é
necessariamente um processo onde cada etapa tem a sua importância e o
seu valor.
E se o seu autor não entender isso, passe-o adiante, na boa.
Agora, isso também não significa que você é o dono do texto. Você não
é. O dono do texto é o autor. E se ele te justificar algo, escute e
respeite.
10. Lucro
Pois é… Aqui é o grande X da questão. Editores experientes debatem a
questão todo dia. Editores de todos os lugares do mundo não pensam em
outra coisa. O mercado está mudando, e muito. A fórmula preço de capa –
distribuição, direito autoral, custos de produção, gráfica, etc = lucro
ainda funciona mas eu tenho certeza de que por pouco tempo.
Precisamos nos reinventar e, sem saber para onde o mercado vai, é bem
difícil acertar. Comece devagar, sem medo mas sem pressa. Edite três,
quatro títulos e trabalhe-os bem. Tiragens pequenas. Pense em formas de
divulgar os livros que saia do ordinário. Sei lá, é caso a caso, uma
história em quadrinho adulta de repente pode ter uma aceitação incrível
no circuito da noite, de barzinhos e etc.
Vai dar trabalho mas vale muito a pena. Quem começa agora precisa não
apenas ser bom no que faz mas precisa ser melhor do que os que já estão
estabelecidos. Se você pensar
“ah, a editora grande XPTO faz assim, então isso é bom pra mim também”
vai fracassar. Você precisa pensar “ah, a editora grande XPTO faz
assim, então eu vou fazer isso e mais aquilo”. Faça sempre mais, pense
muito, reflita muito e gaste pouco.
Uma dica final?
Existem editais de governo que você precisa ficar atento, porque são
uma venda enorme e valem muito a pena. Acompanhe sempre o site da CBL –
http://www.cbl.org.br/ – para ficar informado.
E, claro, boa sorte!