Outro dia, o danado do futebol me emocionou. Não foi no campo,
não, muito menos assistindo uma partida pela TV. Foi quando estava lendo um dos trechos
do livro “Futebol ao Sol e à Sombra” do uruguaio, Eduardo Galeano sobre Mané
Garrincha que, infelizmente, nunca cheguei a ver jogando - só através de filmes e videotapes
-, e de quem eu sou fã de incondicional. E foi por causa dessa emoção que
decidi postar o trecho do livro aqui no
meu blog, para vocês. Aliás, no dia 03 de Setembro, Eduardo Galeano fez 72
anos.
Aqui vai:
“Garrincha
Algum de seus muitos irmãos batizou-o de Garrincha, que é o nome de um
passarinho inútil e feio. Quando começou a jogar futebol, os médicos o
desenganaram: diagnosticaram que aquele anormal nunca chagaria a ser um
esportista. Era um pobre resto de fome e de poliomielite, burro e manco, com um
cérebro infantil, uma coluna vertebral em S e as duas pernas tortas para o
mesmo lado.
Nunca houve um ponta direita como ele. No Mundial de 58, foi o melhor
em sua posição. No Mundial de 62, o melhor jogador do campeonato. Mas ao longo
de seus anos nos campos, Garrincha foi além: ele foi o homem que deu mais
alegria em toda a história do futebol.
Quando ele estava lá, o campo era um picadeiro de circo; a bola, um
bicho amestrado; a partida, um convite à festa. Garrincha não deixava que lhe
tomassem a bola, menino defendendo sua mascote, e a bola e ele faziam diabruras
que matavam as pessoas de riso: ele saltava sobre ela, ela o expulsava, ela o
perseguia. No caminho os adversários trombavam entre si, enredavam nas próprias
pernas, mareavam, caíam sentados.
Garrincha exercia suas picardias de malandro na lateral do campo, no
lado direito, longe do centro: criado nos subúrbios, jogava nos subúrbios. Jogava
para um time chamado Botafogo, e esse era ele: o Botafogo que incendiava os estádios,
louco por cachaça e por tudo que ardesse, o que fugia das concentrações,
pulando pela janela, porque dos terrenos baldios longínquos o chamava alguma
bola que pedia para ser jogada, alguma música que exigia ser dançada, alguma
mulher que queria ser beijada.
Um vencedor? Um perdedor com boa sorte. E a boa sorte não dura. Bem
dizem no Brasil que se merda tivesse valor, os pobres nasceriam sem cu.
Garrincha morreu sua morte: pobre, bêbado e sozinho.”
- Futebol ao Sol e à
Sombra – Eduardo Galeano, (tradução Eric Nepomuceno e Maria do Carmo Brito –
Edição Atualizada) L&PM Pocket/1995 - Garrincha – (pgs 106-107) -
Nenhum comentário:
Postar um comentário