domingo, 16 de novembro de 2008

O destemido Capitão Benjamin



















O DESTEMIDO CAPITÃO BENJAMIN

O decrépito sobrado se situava na parte mais elevada da cidadezinha. Lá do alto, Benjamin gritava a todos os pulmões: - Içar velas, marujos! Sua voz aguda ressoava por todos os cantos do lugar. Isso ocorria todos os dias; dia e noite: - A bombordo! Vamos lá, seus preguiçosos de uma figa! – Desenrolem a bujarrona! Cuidado com o gurupés! Benjamin, não parava. As pessoas que por lá passavam não mais ficavam surpresas ao ver o “capitão” comandar a sua nau como um verdadeiro lobo do mar.

Algumas senhoras que voltavam do rio, onde tinham lavado suas roupas, riam para valer e ainda davam corda pro grande navegador: - Capitão, qualquer dia desses vamos a bordo! Ao que ele respondia: - Só se for pra lavar o convés! O mulherio ia embora rindo da sandice do pobre Benjamin.

Não fazia muito tempo, ele ainda atinava coisa com coisa, mas, aos poucos, foi perdendo o eixo, confundindo fantasia e realidade. Da noite para o dia, começou a viver achando ser ele um simples marujo. Com o tempo, não se sabe como, ele deu a si mesmo a patente de Capitão. Vivia sozinho. Era filho único. Seus pais, muito velhos, haviam morrido quando ele era rapaz. Benjamin se cuidava sozinho. Como um dependente que não tem responsabilidades legais, vivia da pensão de seu pai que fora juiz na comarca vizinha. Quando sua mãe morreu, Benjamin começou a receber ajuda das pessoas da cidade. A população se acostumara com a idéia de que, para ele, sua casa era um navio e a cidade o oceano que distava do lugar 1300 quilômetros.

Certa manhã, o dia nasceu cinzento. O sol não deu as caras. Nuvens pesadas se acumularam por trás da serra vizinha à cidade. De uma hora pra outra, o céu enegreceu e começaram os trovões e relâmpagos. Benjamin, lá do alto de sua “gávea” engrossava a voz anunciando tempestade. Alertando seus “marinheiros” para tomarem as providências que um navio precisaria para enfrentar o mau tempo que se aproximava. Não demorou, a chuva despenhou-se sem pedir licença ou permissão. Desceu grossa como se fosse queda de cachoeira. O rio que cortava a cidade foi o primeiro a sentir a tromba d’água que se precipitara de repente, correndo em caudaloso volume. Arrastando tudo que encontrava pela frente.

Benjamin não parava de gritar: - Vamos lá seus idiotas! Vão querer ir pra prancha! Movam-se! Continuava ele, sobranceiro, todo garboso movendo um timão invisível. Não se incomodava com a chuva que lhe molhava todo o corpo com a ajuda do vento forte. O “capitão” Benjamin levava sua nave na borrasca, com segurança, através de um mar bravio de ondas traiçoeiras.

A chuva não parou nem um momento, pelo contrário, se intensificou mais ainda! A população começou a sentir o efeito da catástrofe que se anunciava. - O rio transbordou! A água se acumulava nas ruas e subia a olhos vistos. Logo estariam inundados até o pescoço. “Salvem o que puderem”, era a tônica mais ouvida pelas ruas naquela hora de desespero.

Choveu o dia todo; a noite toda; o dia seguinte e mais outro, até que, no quarto dia, o que não ficou submerso da pequena cidade, foi a parte superior do sobrado de Benjamin. E foi exatamente lá, onde parte da população se abrigou e conseguiu sobreviver ao dilúvio!

Não se sabe bem quantos pereceram embaixo d’água ou foram levados pela correnteza para dentro do rio. O que se sabe é que, quem conseguiu sair vivo da chuvada, foram aqueles que confiaram na mão firme do grande timoneiro Benjamin, que com a sua “embarcação” conseguiu salvar muitas vidas.

Ninguém esqueceu daquele dia trágico e de Benjamin que, depois que morreu, ganhou uma estátua na praça, digna de um verdadeiro senhor dos mares, que foi construída no lugar do velho sobrado e que ganhou o seu nome: Praça Capitão Benjamin.

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