terça-feira, 23 de julho de 2013

Como eram doces os meus cajus





















COMO ERAM DOCES OS MEUS CAJUS *

Por Hélio Jorge Cordeiro

- Mas que merda é essa?!


Ele se levantou e notou que estava preso. Olhou ao redor e conferiu que sua clausura era uma minúscula cela. Além de pequena, era suja e úmida.  Havia apenas a porta de entrada, que estava fortemente fechada. Ele se sentou no pequeno catre e gritou, desesperado, para que eu o ouvisse:


- Ei, ei, que merda é essa?! O que você está fazendo comigo, porra?


Eu fiquei em silêncio, não lhe respondi.


Ele levantou-se, deu uma volta ao redor do quartinho e disse com revolta:


- Você é mesmo um injusto. Nem ao menos uma janela!


Voltou a sentar. 


- Você vai me tirar daqui, não vai?- disse com um apelo de fazer doer qualquer coração.


Eu disse secamente que não. Eu não iria tirá-lo dalí.


Ele protestou aos berros:


- Seu “sem alma”! Injusto. Prepotente!


Eu disse que eu era. Podia ser.


A porta se abriu, fazendo um forte barulho de ferrolho enferrujado. Uma dupla de fortes guardas entrou. Cada um tinha mais ou menos dois metros de altura e outros tantos de largura. Verdadeiros brutamontes. Os dois foram em sua direção e o pegaram pelo braço.


- Que é que é isso?!  - vociferou ele, esperneando, enquanto os dois guarda-roupas o faziam parecer um boneco de pano.


- Para onde é que eles vão me levar? – perguntou, quase entalando na soleira da porta.


Eu apenas disse que eles iam levá-lo para o pátio.


- Menos mal! – disse ele, agora deixando se carregar pelos dois guardas, pelo corredor afora.


- Você não dá a mínima para mim, não é? – disse com ares de quem quer saber mais do que deveria saber, por isso nem respondi.


No pátio, os dois o levaram para uma parede de granito. O puseram lá com os pés e as mãos atados, sob as injuriadas queixas. Só depois de um tempo é que ele notou que a parede de granito estava toda esburacada por tiros. Havia, por entre as rachaduras, manchas escuras de sangue.


- Porra, você vai me matar?! -  ele gritou desesperado.


Eu não respondi. Seus olhos se arregalaram. Era visível seu medo. Suas pernas tremiam. Ele não aguentou e se molhou todo.


- Porra, mijei nas caças! Você é mesmo cruel!  -ele choramingou igual uma criança mimada.


Cinco soldados, armados com fuzis, se aproximaram e se perfilaram em sua frente, a mais ou menos 6metros dele. Um oficial se aproximou do grupo e ficou ao lado. Pegou um papel e leu em voz alta:


- Francisco Baltazar González, em nome da autonomia criativa e do poder imperativo da criação autoral, seu criador o condena a morrer fuzilado.


- Então você vai me matar mesmo, não é? Nem me deu uma família, para reclamar o corpo. Devo confessar que você foi um tanto compassivo me doando um nome, mesmo sendo ele um nome latino. Você bem que poderia ter me dado um nome inglês... Não, não, um nome francês, seria mais charmoso... Como você é mesquinho.


Aquelas foram suas palavras antes que os soldados obedecessem à ordem do oficial.


- Atenção, pelotão! Apontar, armas!


- Na última hora, você faz com que as balas se desviem de mim e atinjam a parede de granito, não é? – ele disse em tom amigável.


- Fogo!- gritou o oficial.


Os tiros saíram dos canos dos fuzis fazendo uma barulheira dos infernos.


Ele se mantinha de pé. Olhou para o próprio corpo e começou a rir. As balas atingiram a parede.


- Hahaha! Eu não disse! Eu não disse! Você me poupou. Bem que eu disse. Você não seria capaz... – gritava ele rindo loucamente e completou:


- Você me resguardou!


Eu disse que não, enquanto ele ria descontroladamente e gritava como um uma hiena. Eu não o havia poupado, mas que eu escolhera para ele outra forma de morrer: ataque do coração.


- O quê?! Ataque do coração! – surpreendeu-se.


Ele continuou a rir e rir como um louco, até que começou a se contorcer...


- Não! Seu cretino de uma figa! Porque que você ainda quer me matar? – esbravejou ele.


Eu disse que era porque eu era seu criador e lhe dera vida nessa simples história e, portanto, podia fazê-lo morrer quando e do jeito que eu quisesse.


Finalmente, ele fez uma careta, deu um grande e profundo suspiro, pendeu a cabeça à frente do peito e morreu.



* O título é mais uma prova do poder de quem escreve o que quer, como quer, e nesse caso, eu estou me lixando se faz sentindo ou não.

2 comentários:

Euzinha disse...

Na próxima, tu coloca: "Sobre jacarés e bombons", que tal? Nonsense..

Hélio Jorge Cordeiro disse...

Hahahaha! Nós cria, nós pode, né?!