sábado, 29 de agosto de 2009

Que gaivota sacana!


QUE GAIVOTA SACANA!

Estava eu a ver navios à beira da foz do rio, quando uma gaivota voou sobre minha cabeça e meu olhar a acompanhou, interessado, deixando de lado os navios.

Seu vôo era suave, plácido, silencioso. Nesse momento, lembrei Fernão Capelo Gaivota de Richard Bach, livro dos tempos idos de minha saudosa juventude.

Num movimento repentino e ascendente, ela subiu, subiu e depois desceu, e, mais uma vez, pairou sobre as águas. Planou suave até ficar estática, aproveitando uma corrente de ar quente. Não demorou, a gaivota voltou a subir, batendo suas asas sincronicamente. Subiu mais ainda que da outra vez. Então, mirando as águas, ela contorceu-se, juntou suas asas ao corpo e num mergulho quase suicida, a gaivota desceu, desceu, desceu tão ligeira que mais parecia uma flecha lançada por um arco forte e robusto. Seu corpo comprimido cortou o ar como uma lâmina de aço afiada e acertou em cheio a água. Lá se foi ela água a dentro. Ela afundou, e eu não a vi mais! Esperei, esperei mais um pouco ainda, na esperança de vê-la retornar, mas nada. Nada da gaivota voltar. Minha atenção voltou-se, então, pros navios que continuavam ao largo. Imóveis, mortos, gigantes de ferro sem vida a balouçar no vai e vem das ondas.

Foi então que, num arroubo de ousadia, a gaivota veio à tona. Viva como nunca. Ela subiu aos céus como um míssil, respingando água por todas as suas penas. Vitoriosa. Soberba. A gaivota subiu, abocanhando um peixe, cujas escamas, tal qual uma jóia, resplandeciam com a luz do sol, que logo pretendia esconder-se. Sorri, não por ela, ou por sua demonstração de destreza, mas por sua ousadia de, ao emergir, com seu alimento, dar um rasante sobre a minha cabeça, deixando-me acuado por uns instantes.

Não sei se ouvi direito, ou se foi o barulho do vento, misturado as ondas batendo no trapiche, mas eu podia jurar ter escutado a gaivota gargalhar. Pra, logo em seguida, a atrevida ave, vir a cagar-me a cabeça. Voou ela, faceira, na direção dos navios e deles passou. Ainda teve tempo, a danada, de olhar-me todo vexado e sujo a resmungar: “Que gaivota sacana!”

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