Alô amiguinhas, vejam que artigo maravilhoso.
Os gatos e as mulheres 'que
não se dão ao respeito'
ter,
24/09/2013 - 08:10
Sugerido por Vânia
Do blog da Aline Valek
Poucas
expressões na língua portuguesa são tão escrotas quanto o “você tem que se dar
ao respeito”. Além de soar mal, não faz muito sentido. Mas, como todas ouvimos
isso desde pequenas, sabemos bem o que isso significa: temos que ser mulheres
direitas, que não falam palavrão, não gostam de sexo, não mostram partes demais
do corpo, não bebem, não se divertem. Uma mulher que se dá ao respeito
comporta-se de acordo com regras que ninguém sabe quem inventou, e, por estarem
aí há muito tempo, ninguém se incomoda em questionar “por que merdas ainda
seguimos isso?”.
As
“mulheres que não se dão ao respeito” são tão desprezadas e temidas porque não
estão sob controle. Tem coisa que mais tira a sociedade do sério do que uma
mulher que não pode ser controlada? Talvez tenha: um animal doméstico que não
pode ser controlado.
Um gato é
muitas coisas, menos obediente. Você pode tentar ensiná-lo a dormir apenas na
caminha que você arrumou para ele, mas, se ele quiser, vai se esparramar na
mesa de jantar e tirar uma soneca ali mesmo. Ele vai subir na geladeira, entrar
em armários e gavetas sem a sua permissão e não vai esperar pela sua aprovação
para eleger a cadeira do seu escritório como o lugar onde ele vai passar a
tarde dormindo – e deixar uma espessa camada de pelos.
Assim
como as mulheres ditas vulgares, gatos são vaidosos e entregues aos prazeres
que consideramos imorais, como a autonomia ao próprio corpo. Não têm vergonha
de exibir sua anatomia perfeita, sua confiança ao andar e um olhar que apenas
quem é dono de si consegue ostentar. Com a mesma falta de vergonha, deitam-se
como esfinges ou derramam-se com a pança à mostra, porque não consideram que
suas barriguinhas salientes sejam ofensivas ou até mesmo indesejáveis.
A
sensualidade dos gatos constrange os mais moralistas. Seu andar rebolativo, a
cauda em riste para indicar que está de bom humor, o miado fino e dissimulado
emitido para cativar os mais sensíveis, tudo é tipicamente feminino.
Gatos são
vadias. Esfregam-se, massageiam, rebolam, fazem charme e lambem sem pudores.
Para alguns, mostram-se reservados e até mesmo ariscos; para outros, doam-se
com intensidade, ainda que não permitam que sejam dominados. Não adianta exigir
ser amado por um gato ou acreditar que você tem o direito de receber qualquer
sentimento de um felino. O amor é dele e ele dá para quem quiser. Assim são as
mulheres que não se dão ao respeito: amam quem querem, quando querem, do jeito
que querem. Odiá-la por não ser correspondido é ser incapaz de amar alguém que
seja livre.
É por
essas e outras que gatos e vadias atraem ódio e incompreensão. Não é raro
ouvirmos, geralmente vindo de quem não conhece gatos nem nunca conviveu com um,
que estes animais são “traiçoeiros”. Mulheres que vivem sua sexualidade
livremente, da mesma forma, são consideradas “sem caráter”, como se conduta
sexual pudesse determinar se você é uma pessoa boa ou má. E não é que as vadias
e os gatos também têm em comum a tendência de serem julgados como
“interesseiros”?
Tanta
liberdade incomoda. Não é por acaso que mulheres que tenham saído um pouquinho
da linha e gatos sejam alvos de tanta violência. Os que não aceitam o
comportamento nem de um nem de outro recorrem aos argumentos mais intolerantes
possíveis para justificar a violência que empregam como punição por não poder
dominá-los: “gatos são animais do demônio”, “com essa roupa curta, é claro que
ela estava pedindo”, “gato bom é gato morto”, “não se dá ao valor e ainda quer
ser respeitada”.
No final
das contas, a aversão a gatos e o uso da expressão “você tem que se dar ao
respeito” são boas formas de descobrir quem é que não consegue lidar com a
liberdade dos outros. E, pessoalmente, quem eu vou evitar a todo custo.
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