sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Copacabana Mon Amour e outras lembranças


Esta semana tive a oportunidade de assistir a “Copacabana Mon Amour”, produção de 1970, escrito e dirigido pelo catarinense Rogério Sganzerla.

Tive o prazer de desfrutar da amizade de Rogério quando o conheci em 1968, em São Paulo, durante a produção do filme O Bandido da Luz Vermelha. Naquela ocasião, me encontrava em sampa, levado pelo meu irmão, José da Costa Cordeiro, ou Déca, como ele era conhecido no meio cinematográfico e que ajudou a produzir o Bandido - Déca trabalhava na Urânio Filmes produtora do filme. Alguns anos depois, vou reencontrar Rogério no Rio de Janeiro, quando eu trabalhava na Embrafilme. Naquele período, Rogério andava muito amargo e revoltado com o setor cinematográfico brasileiro, que, segundo ele, travava mal os cineastas fora da “igrejinha”, - se leia ai os Barretos e os Farias, provocando muita polêmica no meio.

Voltando a Copacabana Mon Amour, o filme mostra o comprometimento de Rogério com um tipo de cinema mais despojado, quase anárquico, que, a meu ver, foge do cinema novo - movimento cujo símbolo maior foi o diretor baiano Glauber Rocha. Rogério já havia se consagrado com O Bandido da Luz Vermelha, sua obra-prima e que lhe valeu a alcunha de diretor underground. Com Copacabana, mais uma vez, o diretor volta a quebrar as normas, tanto do ponto de vista do cinema convencional, quanto do próprio cinema novo.

Apesar de Copacabana Mon Amour ter uma idéia um tanto simples, Rogério usa e abusa da retórica como apoio para seu discurso filmado. O filme é recheado de várias indiretas - já que estamos falando de uma produção de 1970, quando reinava o famigerado regime de exceção e, portanto, a censura – como, por exemplo, quando Sônia Silk (Helena Ignez), a personagem principal, faz ponto ao lado de uma viatura da polícia ou quando o malandro-cafetão pede dinheiro para uns marinheiros americanos em Copacabana. Até mesmo numa cena em que Sônia fica “presa” do lado de fora de um edifício, batendo no vidro desesperada, enquanto sua amiga (Lilian Lemmertz) fica do lado de dentro. Anteriormente, a amiga de Sônia repetia insistentemente que Sônia fosse para a Argentina, uma referência à situação por que passavam todos os brasileiros que se opusessem ao regime daquela época e cuja alternativa era o exílio.

O filme “conta” a história de uma jovem, Sônia Silk, interpretada por Helena Ignez, - mulher de Rogério e ex-mulher de Glauber Rocha - que sonha ser cantora da Radio Nacional e tem um relacionamento incestuoso com seu irmão, Vidimar, papel de Otoniel Serra, apaixonado pelo patrão. Sônia odeia pobre porque ela mesma é pobre. Ela repete isso várias vezes. Sônia busca seu sonho de cantora apelando para um pai de santo, como faz a maioria dos brasileiros.

Também completando o elenco, Lilian Lemmertz, Guará Rodrigues e Paulo Villaça como o patrão. Ah, o antológico pai de santo Joãozinho da Goméia faz uma ponta interpretando ele mesmo.

A prostituta sonhadora, o malandro-cafetão, o trabalhador-homossexual-passivo, o patrão-homossexual-ativo e o pai de santo-religião, são os personagens que Rogério nos apresenta, como um espelho de uma sociedade explorada, decadente e, o pior, que sem perspectivas de mudança.

A trilha sonora é assinada por Gilberto Gil e pelo próprio Rogério, que aproveita o seu sarcasmo pra fazer uma brincadeira com o seu sobrenome: Sganzerla.

Por fim, este filme é mais um deboche desse grande pensador chamado Rogério Sganzerla, que usou a imagem para falar de suas inquietações e indignações de forma muito particular.

4 comentários:

miguel disse...

Bacana, Hélio!
Legal as tuas sacadas... Eu assisti esse filme faz um tempinho e não tinha conseguido fazer todas essas relações. Show de bola!
Temos que fazer a idéia do cine-clube funcionar para assistir e debater em conjunto.
abraços,

miguel

Hélio Jorge Cordeiro disse...

Valeu, Miguel!

Vamos tocar em frente essa idéia do Cine-clube para nos divertimos.
abraços
Hélio

Anônimo disse...

Helinho é cultura

Hélio Jorge Cordeiro disse...

Cê tá vivo, Felipe! Legal!