segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Parece que o tempo não passa.













Pessoal, fazendo uma faxina geral nos meus "guardados", achei uma matéria com uma entrevista feita comigo numa noite de frio de Agosto de 2007 e assinada pela jornalista Helen Francine, para Revista Vida Útil. Ao ler o material, tive a sensação de que o tempo não passou. Nós é que passamos por ele.

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Franzino Menino do Cine Casa Amarela
Vida Útil – Edição 11 – Setembro 2007
Por Helen Francine

"Caminho ao lado de um escritor por menos de quatro quadras em direção a um café, no calçadão de Balneário Camboriú. A garoa e o friozinho da noite de sexta-feira, no dia 24 de agosto, intensificam a sensação de cansaço do corpo, mas não diminuem a vontade de ouvir novas histórias. Enquanto eu escolho tomar um chocolate quente e cremoso, ele opta pela taça de vinho. Os passos antes apressados dão lugar a visível apreensão e certa curiosidade mediante perguntas desconhecidas.
Ao perceber o ar de receio falo brincando que não há motivo para preocupação já que são apenas duas perguntas bem simples: Por que você escreve? O que significa tal obra? Depois de quase meia hora de contato pela primeira vez escuto uma gargalhada sonora, tão espontânea capaz de relaxar não só a musculatura da face, a região dos ombros, uma força poderosa ao ponto de liberar algumas fibras da alma. O gelo da formalidade é quebrado. Afinal, partilhar lembranças é quase como contar um segredo. Impraticável diante de estranhos.
O cheirinho da xícara de chocolate se espalha pelo ar e talvez ajude a puxar o doce fio da infância. Hélio viveu dias de intenso calor, de pés descalços, jogando pelada com os vizinhos da estrada de chão. Enquanto o emotivo Garrincha brilhava, na seleção brasileira. Ele admirava mais a racionalidade de Didi, capaz de ultrapassar os limites do meio campo e ver jogadas na totalidade.
De repente, a timidez do roteirista, produtor e diretor de documentários, com ampla experiência em Londres e Portugal é transformada no sorriso de brasileiro franzino, com a pele tão bronzeada pelo sol pernambucano que ainda pequeno ganhou dos outros meninos o apelido de negão.
- Aqui, aqui passa a bola “negão”!
Atualmente Hélio Jorge Cordeiro trabalha na divulgação do “O Suicida”, livro publicado há poucos meses, onde personagens fictícios são construídos com matéria-prima da realidade do autor. Enquanto conversa gesticula bastante com as mãos, fala da mistura dos povos que resulta na formas privilegiadas do povo brasileiro. Os olhos dele se iluminam mesmo ao falar dos familiares, especialmente do pai Humberto, da mãe Antônia e do irmão mais velho, o Déca, consagrado produtor cinematográfico que produziu “O Bandido da Luz Vermelha”. Além deles o outro mano “Bertinho” e o cunhado Juarez também habitam outras estrelas... mais distantes da terra.
Ainda menino negão gostava de viajar com o pai que, após breve carreira de ator, passou a distribuir filmes. Para compreender melhor o cenário daquela época, recorro a parte de um dos artigos da pesquisadora Maria Luiza Nóbrega de Morais, do Departamento de Comunicação Social da Universidade Federal Pernambuco. No inicio do século XX, as primeiras exibições de cinema maravilham tanto as pessoas quanto a chegada dos carros. Os filmes aconteciam nos mais diferentes lugares: teatros, festas de largo, circos, cafés e casas de diversão. Os teatros abrigavam as exibições quando a pauta não estava ocupada pelas grandes companhias que visitavam a cidade, ou pelos grupos amadores que encenavam nos bairros. Surgem os cinemas fixos: Pathé, Carlos Gomes, Royal e Palace, no ano de 1909.
O pai de Hélio foi um dos pioneiros na delicadeza de fazer a sétima arte chegar nas pequenas cidades daquela região. Passou a vida dividindo fantasias, esperança, tristeza e sonhos... muitos sonhos, com milhares de anônimos. E talvez por isso as recordações da infância no extinto Cine Casa Amarela, em Recife, sejam tão vívidas, quase tangíveis após mais de quatro décadas. Humberto foi pai, profissional visionário. Para Hélio sem dúvida, o genitor foi ídolo. Quando se debruça diante de mais um roteiro, ou algum outro projeto que envolva cinema, imagino que Hélio toque as próprias raízes. Incrível como comecei a conversa com o adulto que se orgulha por ter casado com a voluntária que ele conheceu no Morro dos cabritos, no RJ, sua amada Maria Helena. Admira a afabilidade da irmã “Bibi” e se derrete ao falar das filhas Júlia Elena e Marianne.
De repente termino o encontro permeada de risos e lágrimas, longe do escritor introvertido. Diante somente, do menino franzino maravilhado com os filmes projetados pelo pai no Cine Casa Amarela.”

2 comentários:

Euzinha disse...

Helius,

que invenção supimpa a photografia, não achas? Parece mesmo que o tempo não parou. Reparou os retratos que te enviei do Arcoverde? Algo te levou ao passado? Como um sopro de Zephiro?

Besos,
Euzinha

Hélio Jorge Cordeiro disse...

Fiquei quieto para não deixar a poeira se dessipar e remexer um pssado tão bom.
bjocas